Agenor Zarpelon
Eloize Motter RodriguesResumo
O presente trabalho
discute a ação do cloro como desinfetante e a presença de trihalometanos
na água tratada. Os THMs constituem um grupo de compostos orgânicos que
se consideram derivados do metano (CH4) em cuja molécula três de seus
quatro átomos de hidrogênio foram substituídos por um igual número de
átomos dos elementos halógenos (cloro, bromo e iodo). O trabalho também
apresenta considerações sobre o uso de alternativas à cloração.
Palavras-chave: cloração, trihalometanos, precursores
Abstract
In this study we
analyzed the action of chlorine as a disinfectant and the presence of
trihalomethanes in treated water. THMs are a group of organic compounds
derived from methane (CH4), in which three of the atoms in a methane
molecule are replaced by the same number of halogen elements (chlorine,
bromine, and iodine). The study also addresses the use of alternative
options to chlorination.
Key words: chlorination, trihalomethanes, precursors
Obter água em
quantidade suficiente e com qualidade adequada para o consumo sempre foi
uma grande preocupação para o homem. Em princípio preocupava-se apenas
com o aspecto estético, rejeitando as que apresentavam cor, odor, sabor
e/ou turbidez. Posteriormente procuraram adequá-las utilizando uma
simples decantação, ou associando uma filtração em leito de areia, de
modo a promover a clarificação.
Como a contaminação da água da fonte não alterava
suas característica estéticas, verificou-se que o odor, sabor, cor e
turbidez não eram critérios suficientes para atestar a qualidade da água
e que havia a necessidade de se aprimorar os recursos de tratamento da
água de modo a garantir também a sua qualidade sanitária.
Com as contribuições de Schwam, Pasteur, Koch e
outros cientistas, para o avanço dos conhecimentos da bacteriologia e
das técnicas de detecção de organismos patogênicos, e a comprovação da
eficiência do cloro não só na remoção de odor, mas também na eliminação
ou inativação destes organismos, iniciou-se um grande progresso na
tecnologia de tratamento de água.
Quando se adiciona cloro na água ocorre a formação de ácido hipocloroso (HOCl) e ácido clorídrico (HCl):
Para valores de pH acima de 4,0 o equilíbrio se desloca para a direita e a quantidade de Cl2 que existe em solução é pequena.
O ácido hipocloroso sofre ionização em uma reação
praticamente instantânea, formando íon hidrogênio (H+) e íon hipoclorito
(OCl-), sendo que o grau de ionização depende do pH e da temperatura.
Para valores de pH inferiores a
6,0 predomina o ácido hipocloroso, porém àmedida em que a temperatura e o
pH se elevam aumenta o grau de ionização do ácido e conseqüentemente, a
concentração do íon hipoclorito.
Para valores de pH maiores que 9,6 e a temperatura de 20º C, praticamente todo ácido hipocloroso sofreu ionização.
O ácido hipocloroso e o íon hipoclorito são denominados cloro livre.
O hipoclorito de sódio (NaOCl) e de cálcio Ca (OCl)2
também produzem íon hipoclorito, o qual estabelecerá um equilíbrio com o
íon hidrogênio da mesma forma que a equação 2.
Portanto, independentemente de se
utilizar o cloro gasoso ou hipocloritos oequilíbrio entre o ácido
hipocloroso e o íon hidrogênio se estabelecerá (equação 2).
Ação desinfetante do cloro
Embora
a desinfecção da água possa ser realizada por diversos meios (calor,
luz ultravioleta, ozônio, dióxido de cloro), a utilização do cloro e
seus derivados tem sido a mais difundida em função de sua facilidade de
aplicação, menor custo econômico e alta eficiência.
A ação do cloro como desinfetante envolve uma série
de fatores, de maneira que não foi possível até hoje se determinar com
precisão sua atuação sobre as bactérias e outros microorganismos. Uma
das teorias mais difundidas se refere à reação do ácido hipocloroso
(HOCL), com um sistema enzimático (possivelmente sobre triosefosfato
dihidrogenase) que éessencial na oxidação da glucose processo este muito
importante para o metabolismo celular bacteriano.
Comprovadamente o ácido hipocloroso exerce maior ação
desinfetante que o íon hipoclorito (OCL-), o que se explica pela maior
facilidade de penetração do ácido através da parede celular, por ser uma
molécula pequena e neutra. O íon hipoclorito por sua vez tem maior
dificuldade em atravessar a parede celular e atingir o sistema
enzimático em função da sua carga negativa. Portanto, é possível que a
maior dificuldade na eliminação das formas esporuladas se deva à
resistência a penetração do agente desinfetante oferecido pelo seu
envoltório de proteção.
A necessidade de dosagens mais elevadas de cloro para
a destruição de vírus favorece a teoria de que a ação bactericida se dê
por ação enzimática, sendo os vírus desprovidos de enzimas a sua
destruição só é possível por oxidação direta da matéria protéica, o que
exige muito mais cloro.
Toda desinfecção deverá ser controlada por análises
bacteriológicas e, para uma ação operacional mais rápida, também através
da determinação do teor de cloro residual. Para garantia da desinfecção
e uma prevenção a futuras contaminações a Portaria 36/90 do Ministério
da Saúde recomenda concentração mínima de 0,2 mg/l de cloro livre em
qualquer ponto da rede de distribuição.
O cloro como agente oxidante
Desde o
primeiro registro do uso do cloro como agente desinfetante para água, em
1896 (Base naval Austro-Húngara de Pola, no mar Adriático); o uso do
cloro se disseminou por todo o mundo e hoje 90% das estações de
tratamento de água o utilizam. É um monopólio tradicional que nenhum
outro produto jamais conseguiu ou igualou.
Nos últimos anos, tem-se testemunhado o crescimento
vertiginosono consumo de cloro por parte das empresas de saneamento para
fazer frente às diversas ameaças epidêmicas, desde a cólera à dengue.
O cloro não só é um grande
desinfetante eficaz, como também possui uma ação oxidante comprovada.
Assim sendo é empregado no tratamento da água também para outros fins
como: oxidação de ferro e manganês, remoção de H2S, controle de odor, cor, sabor, remoção de algas etc.
O aumento da
poluição dos mananciais, principalmente por compostos orgânicos,
provocou uma grande preocupação em se verificar os efeitos causados pela
presença destas substâncias na água destinada ao abastecimento público.
Constatou-se que uma grande parte destes compostos
orgânicos mesmo em pequenas concentrações, pode provocar problemas de
ordem estética e, alguns podem gerar efeitos sérios e irreversíveis
sobre o consumidor em função de seu potencial tóxico.
A Environmental Protection Agency (EPA) publicou em
1977 um relatório com o resultado de uma pesquisa efetuada em 113
sistemas de abastecimento, procurando detectar a concentração de 27
compostos orgânicos suspeitos de causar problemas a saúde da população.
Dentre estes, 27 compostos verificaram a presença de quatro tipos de
trihalometanos, os quais foram detectados em todas as águas que recebiam
cloro como desinfetante e em concentrações superiores aos demais
contaminantes organo-sintéticos.
Os THMs constituem um grupo de compostos orgânicos
que, como indica seu nome, se consideram derivados do metano (CH4) em
cuja molécula três de seus quatro átomos de hidrogênio foram
substituídos por um igual número de átomos dos elementos halógenos
(cloro, bromo e iodo). Estes três átomos dehidrogênio podem estar
substituídos por uma só classe de halógenos como é o caso do
triclorometano ou clorofórmio, ou por dois diferentes elementos formando
o bromodiclorometano ou por cada um dos três como se observa no
iodobromoclorometano. Alguns do grupo possuem nomes especiais:
clorofórmio, bromofórmio e iodofórmio. Ainda que para ser denominados
sejam vistos como precedentes do metano, este gás nada tem a ver com sua
formação real nas águas que são desinfetadas com cloro; pois neste meio
eles se originam a partir de produtos orgânicos muito mais complexos
que o metanol, que são de ocorrência comum nas águas superficiais, os
chamados ácidos húmicos e fúlvicos.
Estas substâncias são derivadas da decomposição da
matéria orgânica vegetal, sendo constituídas de mistura de polímeros com
estruturas aromáticas heterocíclicas, grupos carboxila e nitrogênio.
São denominadas "precursores de trihalometanos" e em geral só tem
significado sanitário devido à formação dos THMs.
Dados de laboratórios demonstram que algas verdes e
algas verdes-azuis (biomassa de algas e seus produtos extracelulares)
reagem também com cloro, produzindo THMs.
Estruturas químicas dos THMs
Triclorometano ou clorofórmico
Bromodiclorometano
Iodobromoclorometano
Dibromoclorometano
Tribromometano ou bromofórmio
Os trihalometanos são,
em estado puro, substâncias líquidas (clorofórmio, bromofórmio) ou
sólidas (iodofórmio) à temperatura ambiente (10 a 30ºC); de odor
característico (uns agradáveis e outros repulsivos); pouco solúveis em
água, mas muito solúveis em diluentes orgânicos.
Relativamente ao comportamento químico dos THMs,
pode-se dizer que são compostos estáveis, não facilmente oxidáveis e não
diretamente combustíveis, não-inflamáveis.
Estão ainda em estudos métodos de análise por reação
colorimétrica que apresentem suficiente sensibilidade para detectá-los e
medi-los.
As propriedades assinaladas dos THMs nos indicam que
sua eliminação da água por uma aeração somente é eficaz nos casos dos
mais voláteis e que, uma vez formados durante a cloração sua
decomposição é difícil, apresentando resistência à oxidação mesmo por
agentescomo o ozônio.
A formação dos THMs
durante a desinfecção da água com cloro livre obedece a um complicado
mecanismo pelo qual as espécies químicas que o halógeno (cloro, bromo e
iodo) forma com a água, reagem com os derivados do húmus que este meio
normalmente contém.
Tem-se trabalhado muito para tentar se estabelecer a
complexidade e as características das substâncias húmicas e fúlvicas e
assim elucidar os detalhes de sua combinação com o cloro.
Devido à complexidade dos precursores orgânicos e às
diversas maneiras possíveis de reação, a química do aparecimento dos
THMs nas águas não está bem esclarecida.
O que se pode assegurar é que para a formação dos
THMs nas águas se requer, pelo menos, a presença do cloro livre e dos
precursores orgânicos. Quando um destes fatores não existir a reação não
ocorre. A equação química geral que representa a sua produção seria a
seguinte:
Os fatores mais importantes que afetam a cinética da reação e, em alguns casos, o produto final podem ser:
A formação dos THMs em condições naturais não é
instantânea. Em algumas circunstâncias a sua formação pode completar-se
em menos de uma hora, em outra situação é possível que se exijam vários
dias antes de que ocorra a máxima produção de THMs.
A reação se faz menos lenta quando aumenta a
temperatura ou o pH, e em presença de brometos. Uma grande parte dos
THMs que chega ao consumidor são produzidos no sistema de distribuição
onde o contato do cloro livre com os precursores ocorre por um longo
período de tempo.
Existe uma dependência típica da temperatura que,
a cada 10º C de incremento, eleva ao dobro a taxa de formação de THM.
As variações sazonais, no que se refere a produção de THM, observada em
estações de tratamento que utilizam a mesma fonte de água são, em grande
parte, efeito da temperatura.
Foi comprovado que a taxa de formação de THM
depende do pH. Em geral a formação se eleva com o incremento do valor de
pH para as reações entre o cloro livre e a maioria dos precursores
apesar de se ter observado algumas exceções.
Os resultados de várias investigações têm mostrado
uma forte dependência do pH; um incremento do triplo da formação, por
cada unidade do aumento do pH. Esta elevação na taxa de produção dos
THMs era de se esperar já que uma das maneiras de explicar a aparição
dos mesmos, a reação clássica dos halofórmios, é acrescentada por bases.
Tem-se insinuado uma explicação para o efeito do pH.
Uma macromolécula do precursor húmico, simplesmente se abrevia pela
mútua repulsão das cargas negativas a níveis altos de pH; incrementando
assim a disponibilidade de posições ativas adicionais na molécula do
precursor.
É um fato comprovado que os bromatos têm uma ação
acentuada na formação dos THMs, manifestou-se que o bromato afeta tanto
a taxa de reação quanto a quantidade total de THM.
O efeito do bromato na cinética da reação dos
trihalometanos não está bem esclarecido. O mecanismo aceito, pelo qual o
bromato participa na reação incluia oxidação do bromato a bromo e ácido
hipobromoso, os quais por sua vez reagem com os precursores orgânicos. O
bromo competiria mais efetivamente que o cloro pelas posições ativas
das moléculas húmicas precursoras.
Pelo que se observou, se conclui que o bromo supera o cloro na formação dos THMs.
Tem se sustentado que os THMs se originam
mediante a conhecida "reação do halofórmio" que teria lugar entre o
cloro livre e os compostos orgânicos precursores. Este ponto de vista
está muito controvertido atualmente. Tem-se demonstrado que a reação
pode ocorrer por mecanismos distintos aos da reação do halofórmio.
Pode-se ter em conta que qualquer oxidante usado para
desinfecção da água atuará reciprocamente com os produtos químicos já
presentes na água bruta para formar outros produtos indesejáveis que
podem aparecer na água tratada. Por conseqüente, algo fundamental na
potabilização das águas é eliminar ao máximo os precursores antes da
adição do oxidante para reduzir ao mínimo a demanda do desinfetante e a
possível formação de subprodutos nocivos.
Com relação ao controle da concentração dos
precursores na água bruta (potencial de clorofórmio), investigou-se as
técnicas de coagulação, sedimentação e uso de pó absorvente e carvão
ativado granular. Para a remoção do clorofórmio depois de formado, as
pesquisas dirigiram-se principalmente para o emprego do carvão ativado
granular, pó absorvente e aeração.
O emprego do carvão ativado granular é a melhor
técnica entre todas asopções para controlar eficazmente tanto a remoção
das substâncias orgânicas como os trihalometanos.
Compete aos responsável pelo serviço de água avaliar a
capacidade operacional do processo de tratamento e apurar quais as
medidas a serem tomadas na coagulação/decantação para obter melhores
resultados na remoção dos THMs. Isto pode incluir a necessidade de
aprimorar a coagulação/floculação executando com maior freqüência o
ensaio de jar-test e assim variar a dose ou o tipo de coagulante para
uma determinada qualidade de água, modificando ainda o ponto de
aplicação do cloro para locais com baixo conteúdo de matéria orgânica.
As experiências demonstram que a adoção desta prática diminui
consideravelmente a concentração dos THMs na água de consumo humano.
Portanto, o responsável pela unidade de tratamento de água deve avaliar a
possibilidade de alterar o ponto de aplicação de cloro, mas sem
prejuízo da segurança bacteriológica da água a ser consumida.
Atualmente dispõe-se de várias técnicas para a
identificação e medição dos THMs dentro dos limites baixos de
microgramas por litro.
A mais popular das técnicas de quantificação é a da
purga e seqüestro, que foi aperfeiçoada pela Agência de Proteção
Ambiental (EPA). Outra técnica é a extração por solvente. A última é
consideravelmente mais simples e facilmente adaptável à amostragem
automática. Devido justamente ao seu baixo custo, a técnica de extração
por solvente é a escolhida para análises de rotina de THMs. Foi
demonstrado que as duas técnicas são de exatidão comparáveis.
Ambas as técnicas requerem a cromatografia a gás como
etapa final da análise, a técnica de purga e seqüestro inclui a remoção
dos THMs da amostra de água mediante o uso de gás inertecomo o hélio e a
absorção dos mesmos numa resina. Esta é aquecida e o gás faz fluir
dentro do cromatógrafo para a separação e quantificação dos THMs. A
extração com solvente inclui simplesmente o tratamento da amostra com um
solvente de baixo ponto de ebulição, como o tolueno ou o hexano para
que os THMs passem ao solvente. Em seguida se injeta o extrato no
cromatógrafo de gás para a separação e quantificação dos trihalometanos
individuais.
Tem-se demonstrado
que o clorofórmio é absorvido rapidamente pela mucosa intestinal quando,
contido na água e esta é consumida. Distribui-se através dos tecidos
corporais, concentrando-se nas membranas lipídicas e se acumula nos
tecidos adiposos com uma longa vida de resistência média. Seu
metabolismo tem lugar no fígado e, principalmente, em menor proporção
nos rins e outros tecidos. Esta biotransformação, se ocorre, pode
convertê-lo em dióxido de carbono, íon cloreto e outros metabólicos não
identificados.
Dados toxicológicos demonstram que o clorofórmio, em
dose elevada, é um carcinógeno nos roedores (ratos e ratazanas). Como o
metabolismo destes animais é qualitativamente semelhante ao do homem, se
suspeita que seja também um carcinógeno humano. Estudos epidemiológicos
sugerem igualmente este risco.
Investigações recentes assinalaram uma correlação
positiva entre os níveis de clorofórmio na água e os carcinomas da
bexiga e do intestino baixo.
Vistos em conjunto aos estudos epidemiológicos,
proporcionam evidência suficiente para manter a hipótese de que a
presença do THM nas águas potáveis representa um risco para a saúde já
que podem estar incrementando a mortalidade por câncer. Em conseqüência,
devido à existência de perigo potencial para o homem, os níveis de
clorofórmio naágua devem reduzir-se tanto quanto permitam as
possibilidades tecnológicas e econômicas, tendo em conta a utilização de
métodos que não comprometam a proteção quanto enfermidades infecciosas
transmitidas pela água.
Pelas circunstâncias observadas a Agência de Proteção
Ambiental (EPA) fixou um limite máximo de 0,1 mg/l (100 ug/l) de THM
nas águas de abastecimento e no Brasil, somente com a portaria 36/90
aprovada pelo Ministério da Saúde, é que se determinou o valor máximo
permissível, portanto o nível de segurança assumido pela Organização
Mundial da Saúde é de 100 microgramas por litro para concentração de THM
totais (sendo este valor a soma das concentrações de clorofórmio,
dicloroetano, dibromocloroetano e bromofórmio).
Quando a Agência de Proteção Ambiental (EPA) dos EUA
fixou este limite, do clorofórmio e outros trihalometanos na água para
consumo humano, agiu dentro de uma filosofia que levou em conta a
possibilidade potencial da substância estar ocasionando danos à saúde
das pessoas submetidas a uma exposição crônica por toda uma vida gerada
pela ingestão de clorofórmio, mesmo à baixa concentração.
De concreto, sabe-se que até agora não se identificou
nenhum efeito tóxico observável à exposição com certa duração
proveniente do clorofórmio existente comumente em pequenas concentrações
no ar, alimentos ou na água dos sistemas públicos de abastecimento.
Fatos mais recentes, com relação a problemas
decorrentes de um suposto aparecimento de THMs acima dos níveis
recomendados pela Portaria 36/90 do MS levaram a Fundação Nacional de
Saúde (Funasa) a avaliar a qualidade de água fornecida pela Sanepar à
população de Curitiba e Região Metropolitana. A Funasa realizou visitas
técnicas aos sistemas da Sanepar e coletas de amostras no sistema
distribuidor em parceria com a equipe da Vigilância Sanitária da
Secretaria de Saúde do Estado do Paraná, e outras entidades.
Após a avaliação dos resultadosdas amostras
coletadas, o relatório emitido pela Funasa conclui que foram detectados
baixos níveis de THMs.
O maior problema da água de Curitiba está associado à vulnerabilidade ambiental de seus mananciais.
Em busca de melhoria na qualidade da água bruta foi
definida a criação de um grupo interdisciplinar que deverá elaborar e
implementar um plano de trabalho com metas de curto, médio e longo prazo
para a recuperação ambiental da bacia hidrográfica. Fazem parte deste
grupo representantes da sociedade, dos setores de saúde e meio ambiente
entre eles Instituto Ambiental do Paraná (IAP), Ordem dos Advogados do
Brasil (OAB/PR), Conselho Regional de Engenharia (Crea), Associação
Brasileira de Engenharia Sanitária (Abes), Empresa Paranaense de
Assistência Técnica e Extensão Rural (Emater), Sanepar, secretarias
estaduais e municipais de Saúde, de Meio Ambiente, comitês de bacia.
O relatório emitido pela Funasa é enfático ainda em
assegurar que "segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS) os estudos
epidemológicos existentes ainda não permitem concluir que os THMs sejam
cancerígenos para o homem. A National Academy of Sciences, ao avaliar
uma revisão de 13 estudos epidemiológicos chegou à conclusão que não
existem informações suficientes para admitir uma associação entre a
presença de THMs em água e o desenvolvimento de câncer em seres humanos.
O índice encontrado em Curitiba foi menor que 10 miligramas por litro",
controle este que vem sendo periodicamente realizado pela Secretaria de
Estado de Saúde em amostras coletadas nos sistemas da Sanepar.
Para a Sanepar as recomendações da Funasa contidas no
relatório são extremamente positivas. A empresa concorda ainda que cabe
a cada órgão atuar dentro de suas competências permitindo avaliar as
pressões antrópicas exercidas sobre os mananciais de abastecimento. A
degradação ambiental dos mananciais de Curitiba não é provocada pela
Sanepar, ao contrário, a Empresa como usuária dos recursos hídricos
sofre diretamente as conseqüências do comprometimento da qualidade da
água dos rios. Prova disto, é a geração de pequenas quantidades de THMs.
Uma
das grandes preocupações das autoridades sanitárias é que, na tentativa
de diminuir a concentração dos THMs atribuída à prática de cloração,
venham a ser adotadas técnicas de desinfecção que ofereçam menor
segurança a uma eventual contaminação da água. Nos estudos sobre o
emprego de outros desinfetantes foram utilizadas as aplicações com
ozônio, dióxido de cloro e cloraminas, estes três desinfetantes não
produzem trihalometanos, embora eles possam provocar o aparecimento de
outros subprodutos ainda não identificados e cuja toxicidade é
desconhecida.
Apresenta-se aqui algumas das
características e ações destes produtos usados como alternativas de
desinfecção da água nos processos de tratamento.
O ozônio é uma forma alotrópica do oxigênio com
odor peculiar, muito volátil, pouco solúvel na água, decompondo-se
facilmente a temperaturas elevadas. Devido à sua baixa estabilidade, a
produção do ozônio tem que ser efetuada no próprio local da aplicação,
exigindo investimentos elevados nas instalações, além de um consumo de
energia elétrica variando entre 25 KWH até 35 KWH por grama de ozônio.
A utilização do ozônio apresenta vantagens e desvantagens tais como:
• Ele é um poderoso oxidante que atua rapidamente sobre a matériaorgânica.
• A sua ação desinfetante é efetiva numa grande faixa de variação de temperatura.
• A sua ação bactericida esporicida é rápida e maior
que todos os outros agentes conhecidos. Dizem ser de 300 a 3.000 vezes
maior e mais rápida do que a do cloro e só necessita de pequenos
períodos de contato.
• Não são gerados nem intensificados odores porque não há formação de complexos de adição e substituição.
• Pode ser usado para remoção de pesticidas ou outras substâncias orgânicas, tais como: detergentes sintéticos, herbicidas, etc.
• Na sua decomposição na água, produz unicamente oxigênio.
• Seu poder oxidante não é afetado pelo pH da água.
• O ozônio é um gás muito venenoso; sendo a sua concentração máxima permissível na atmosfera de 0,1 mg/m3.
• Não apresenta odor e nem cor perceptível, tornando-se assim, muito perigoso.
• Não deixa resíduo para uma ação desinfetante posterior.
• Requisitos de energia elétrica, custo, instalação e operação são altos, cerca de 10 a 15 vezes maiores que para o cloro.
• A mistura ozona-ar produzida pela necessária
geração própria ao ponto de aplicação é apenas pouco solúvel na água e a
produção se torna complicada quando a temperatura e a umidade são
elevados.
• O processo é menos flexível do que o cloro para um ajuste de dosagem no caso de variação de vazão e qualidade da água.
• Não existem técnicas analíticas suficientemente específicas ou sensíveis para o controle imediato e eficiente do processo.
• As águas com alto teor de matéria orgânica
(principalmente algas) exigem um pré-tratamento para satisfazer a
demanda de ozona.
Em resumo, o ozônio é um bom método de desinfecção e
de controle de odor e sabor da água. Infelizmente, o custo do
equipamento é muito mais elevado do que os cloradores convencionais e a
despesa com a eletricidade necessária para a sua produção é maior do que
a empregada na aquisição de doses equivalentes de cloro liquefeito.
Entre as dificuldades aqui colocadas quanto à
ozonização das águas de abastecimento público destaca-se como grande
inconveniente do ozônio a sua impossibilidade de produzir um residual
que previna eventual contaminação do sistema, além dos subprodutos que
ocasionalmente podem vir a ser identificados. Isso é muito importante,
principalmente para os nossos sistemas distribuidores que possuem
regiões operando com baixa pressão e sujeitos às conseqüências da
pressão negativa. Contudo, numa hipótese de que este problema fosse
sanado, a presença de um residual é sempre uma exigência de lei para
garantir a saúde do consumidor. Portanto, se a utilização do ozônio
exige a adição do cloro para se ter um residual, este reagirá com os
precursores orgânicos dos trihalometanos e então pouco progresso é
obtido.
O dióxido de cloro é um gás muito
oxidante e que não pode ser transportado como cloro no estado líquido,
necessitando que sua fabricação se faça no local do emprego (figura 1).
Os
investimentos da instalação produtora de dióxido de cloro são elevados e
somente justificáveis para uma produção superior a 1 tonelada por dia. A
fórmula química do dióxido de cloro é ClO2,
constituindo-se num oxidante energético que possui propriedades
bactericidas, esporicida e viruslicidas, podendo também, em alguns casos
destruir os compostos orgânicos nocivos e oxidar os compostos redutores
tais como: sulfatos ou óxidos metálicos. A ação bactericida do dióxido
de cloro tem sido objeto de numerosos estudos, demonstrando-se que
permite uma rápida eliminação das bactérias numa gama de pH superior ao
do cloro. Para o caso de águas ligeiramente alcalinas, a velocidade de
esterilização do dióxido de cloro é superior àquela do cloro.
Enfim, o dióxido de cloro
tem uma estabilidade muito maior que o cloro e sobretudo maior que o
ozônio. Assim, uma água tratada com 0,35 ppm de ClO2
e conservada na obscuridade a 20º C contém ainda, após 48 horas de 0,20
a 0,25 ppm do agente desinfectante. O cloro, nas mesmas condições
praticamente desaparece, ao fim de algumas horas e o ozônio por seu
lado, tem uma estabilidade de 20 minutos no máximo.
O ClO2
se mostra particularmente vantajoso quando a água deva ficar durante um
tempo mais ou menos longo nas redes de distribuição para manter uma
qualidade bacteriológica.
As primeiras aplicações do dióxido de cloro no
tratamento das águas tiveram por objetivo a destruição de sabor
resultante da presença de traços de fenóis ou de seus compostos
clorados. Mellen, F. N. citou que seu custo em relação ao cloro é
elevado, atingindo proporções, como no caso da Holanda, 17 vezes
superior ao cloro.
O interesse da ação do dióxido de cloro sobre os
microorganismos foi colocado em evidência pelas estações de tratamento
de água potável na região de Paris, onde o pré-tratamento com dióxido de
cloro é aplicado desde 1953. Este pré-tratamento elimina não somente
odor e sabor ofensivos aos sentidos, como melhora o estado e a duração
da vida dos filtros impedindo a proliferação dos microorganismos.
Por outro lado, além de não estar ainda comprovada a
sua eficiência na redução dos trihalometanos, o dióxido de cloro tem,
como vantagem, propiciar um residual ao longo do sistema distribuidor.
Não obstante, como na ozonização da água, além dos
elevados investimentos requeridos, também se desconhece a eventual
formação de subprodutos e sua toxicidade.
O cloro, sob a forma de ácido hipocloroso, reage com a
amônia presente na água formando as monocloraminas, dicloraminas e
tricloreto de nitrogênio. As reações ocorrem mais rapidamente em valores
de pH mais baixo, onde a concentração do ácido hipocloroso não
dissociado é mais elevada, conforme as equações:
A ação bactericida das cloraminas
é muito menor do que o cloro livre, dissociado ou não. Para um pH de
8,5 onde mais de 85% do ácido hipocloroso seapresenta dissociado, o
efeito bactericida deste último é pelo menos 25 vezes maior do que o
cloro combinado ou cloramina.
Estudos mais recentes confirmam que é necessário um
tempo de contato das cloraminas de aproximadamente 100 vezes superior,
para inativar as bactérias do grupo coliforme para uma mesma
concentração de cloro livre. Por esta razão as cloraminas não são
recomendadas para serem utilizadas como um único desinfetante da água
dos sistemas públicos de abastecimento, apesar de não produzir
trihalometanos. Devido ao seu baixo poder bactericida, a cloramina não
deve ser então usada exclusivamente, sendo necessária a adição de cloro
para produzir um residual livre, podendo haver a formação dos
trihalometanos.
Em resumo, as pesquisas parecem indicar que a
substituição do desinfetante talvez não seja a solução mais recomendada
ou mesmo prudente para eliminar os THMs, ou seja, não se pode incorrer
no risco de substituir um problema por outro.
A substituição do cloro por outro desinfetante da
água pode trazer muito mais riscos do que benefícios, pois, deve-se ter
em conta que a queda das doenças transmissíveis pela água somente foi
alcançada com o emprego da técnica da cloração.
O uso do ozônio, dióxido de cloro e cloraminas reduz
grandemente a formação dos THMs. Não obstante seus custos elevados, a
impossibilidade técnica do ozônio manter um residual, ao longo do
sistema distribuidor, as dificuldades do emprego do dióxido de cloro e
cloraminas sem excesso do cloro residual, o desconhecimento de eventuais
subprodutos formados e a sua toxicidade, comprometem a decisão pela
troca do desinfetante.
A formação de
trihalometanos em função da cloração da água é conhecida desde 1974 e
por isso controlada. A Portaria n.º 36 de 19.01.90, do Ministérioda
Saúde, que regulamenta a qualidade de água destinada ao consumo humano,
limita o teor de trihalometanos em 100 microgramas/litro.
A Portaria n.º 1469, de 29 de dezembro de 2000 do
Ministério da Saúde, mantém este valor. Para que haja formação de
trihalometanos, o manancial de água bruta deve ter a presença dos
chamados agentes precursores, sendo estes compostos orgânicos naturais
que compõem o húmus da Terra.
Sabe-se que a exposição ao clorofórmio, um dos
principais THMs, nas concentrações encontradas, parece não ocasionar
efeitos agudos à saúde humana. Todavia, as evidências toxicológicas e
epidemiológicas, à luz das informações científicas disponíveis, induzem a
admitir que estas substâncias constituem num risco à saúde humana em
períodos de exposição com longa duração.
A tarefa dos profissionais encarregados de
regulamentar este controle é de maximizar a proteção à saúde pública
através do gerenciamento entre os riscos microbiológicos e os riscos dos
contaminantes químicos na água potável. Para isso torna-se
imprescindível a adoção de amplos programas de apoio tecnológico, que
induzam a ações racionais em sintonia com a capacidade de resposta da
estrutura de saneamento existente, para que se aprofundem as pesquisas
sobre os THMs e as melhores alternativas de desinfecção para as águas de
abastecimento público.
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Fonte: www.sanepar.com.br
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